08 junho 2006
um beijo na ponta dos dedos
meu único país é sempre onde estou bem
é onde pago o bem com sofrimento
é onde num momento tudo tenho
o meu país agora
são os mesmos campos verdes
que no outono
vi tristes e desolados
e onde nem me pedem passaporte
pois neles nasci e morro a cada instante
que a paz não é palavra para mim
o malmequer a erva o pessegueiro em flor
asseguram o mínimo de dor indispensável
a quem na felicidade que tivesse
veria uma reforma e um insulto
a vida recomeça e o sol brilha
a tudo isto chamam primavera
mas nada disto cabe numa só palavra
abstracta quando tudo é tão concreto e vário
o meu país são todos os amigos
que conquisto e que perco a cada instante
os meus amigos são os mais recentes
os dos demais países os que mal conheço e
tenho de abandonar porque me vou embora
pois eu nunca estou bem aonde estou
nem mesmo estou sequer aonde estou
eu não sou muito grande nasci numa aldeia
mas o país que tinha já de si pequeno
fizeram-no pequeno para mim
os donos das pessoas e das terras
os vendilhões das almas no templo do mundo
sou donde estou e só sou português
por ter em portugal olhado a luz
pela primeira vez.
um beijo na ponta dos dedos
ao peregrino e hóspede sobre a terra,
no dia em que regressámos um ao outro.
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