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11 setembro 2007

O Senso e a Cidade l Os pisos térreos do Terreiro do Paço


aqui ou
Filha de um alfarrabista e com uma infância entre livros e palavras lembro-me muitas vezes da limitação de espaço de Almada Negreiros que numa Invenção de um Dia Claro não teria vida suficiente para ler todos os livros de uma livraria. Esse sonho dispensaria as pessoas, essa grande riqueza que mais me move quando penso na ideia de uma cidade. A minha angústia será sempre outra… a de não ter anos de vida suficientes para ver o Terreiro do Paço como sempre o imaginei. Mesmo ainda não tendo realizado o sonho de chegar a São Petersburgo de barco defenderei para sempre a nossa praça como a mais bonita e com mais potencial da Europa.

Desde o mês passado que aos Domingos a Praça do Comércio passou a ser das Pessoas. A iniciativa implica o encerramento ao tráfego automóvel das laterais do Terreiro do Paço e o troço da Ribeira das Naus entre o Largo do Corpo Santo e o Campo das Cebolas. Uma exposição de fotografia, aulas de Yoga, venda de flores, aluguer de bicicletas, venda de livros, uma biblioteca itinerante, um ciclo de cinema documental sobre Lisboa ou mesmo um Quarteto de Jazz do Hot Clube passaram a dar mais vida a esta jóia da coroa lisboeta. Está melhor, mas não chega.

Numa semana em que António Costa, Manuel Salgado, José Sócrates, José Miguel Júdice, Nunes Correia e Paula Vitorino reorganizaram ideias para a reabilitação da frente ribeirinha e em que Maria José Nogueira Pinto volta a estar à frente do projecto Baixa-Chiado quero continuar a desejar muito mais da nossa cidade branca. Retirem sim as lojas dos chineses do comércio tradicional da Baixa em decadência, mas libertem os pisos térreos do Terreiro do Paço e tragam mais Martinhos da Arcada, para nós “Pessoas” nacionais e estrangeiras vivermos uma cidade dignificantemente europeia.

Enquanto espero pela devolução do Cais das Colunas ao remetente desejarei semanalmente e por estas linhas uma cidade viva e preservada que tudo tem de mão beijada. Uma cidade que afinal apenas precisa de pessoas e do seu bom senso.
coluna de opinião publicada a 11 Setembro no jornal Meia Hora

3 comentários:

  1. Querida sancha,

    Aqui vai a minha opinião sincera, espero que não leves a mal e se o fizeres diz me.

    Gostei muito da escrita do inicio, da maneira como através de um sonho de Almada Negreiros nos pões no plano de Lisboa Urbana.

    Mas tenho duas posições muito claras sobre o teu texto, uma como arquitecta, onde não sei sinceramente se a dignidade de uma praça passa por saltimbancos, vendas e objectos itinerantes ou efémeros. O silêncio, a clareza de um plano que nos leva até ao mar onde nos pudéssemos sentar em contemplação parece me suficiente. Não descuro a necessidade de comércio, só não sei se trazer a rua Augusta para a praça, cheia de turistas e a as seus disfarces de férias seria o melhor.

    A outra é como cidadã do mundo, de quem ainda com 30 anos, só viveu ao todo em Portugal metade da sua vida, se fizer bem as contas dos anos fora. "Os chineses" do modo como os descreves é um afirmação xenófoba e desconsiderada, que considero muito perigosa. Pessoalmente não tenho nenhuma estima por ver o "cavalgar" dessas lojas nas nossas cidades da maneira como o fazem, mas a culpa é da nossa legislação e sobretudo da nossa falta de capacidade de resposta ao mercado e portanto fazer-lhes frente através da qualidade e da diferença.
    Os Portugueses durante anos foram eles os "chineses" de varios paises, basta ires ao Norte de Portugal para o descubrires, nem a Europa nem o mundo pertence só aos conterrâneos desse continente, como bem sabes.

    Espero que me conheças bem para saber que a minha franqueza não é um ataque, mas sim uma preocupação e posição clara na vida.

    bjs
    vero

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  2. Querida Vero, se não conseguisse ouvir opiniões diferentes eu mesma não expunha a minha. Debates são sempre bem-vindos e estimulam o cérebro.

    Talvez a frase que o Meia Hora ressalvou no meu texto te tenha induzido em erro ou tenhas percebido mal. Eu teria escolhido outra. (a que coloquei a bold no texto deste blog).

    Nunca falei em “chineses”, mas sim em “lojas dos chineses”. Talvez fosse ainda mais correcto “lojas chinesas”. Ao estar a fazer o Guia ConVida em Campo de Ourique e ver o que as lojas chinesas fizeram ao comércio, aos comerciantes e à energia positiva daquele bairro...

    Não tenho nada contra "chineses", ou mesmo "lojas chinesas" mas não nas áreas nobres da cidade. Até poderíamos colocar a hipótese de haver uma loja chinesa por bairro, mas não dez como é o caso de Campo de Ourique e de muitos outros bairros de excelência na cidade. Por mim não marchavam apenas essas lojas chinesas e confesso que as mesmas servem de caixote lixo para dizermos mal do que está mal quando muitas das lojas portuguesas arrasam com a beleza patrimonial dos estabelecimentos ou com a arte de bem servir.

    Um amigo meu que “fugiu” para Madrid chegou a escrever que Portugal se não tem cuidado pode-se transformar numa loja dos 300. Infelizmente concordo com ele.
    A Baixa deveria ser um sítio cheio de glamour. Para isso sei que a lei do arrendamento teria de mudar e isso tem andado a passo de caracol. Estamos longe de ter um economia que consiga aguentar a sofisticação que gostaria de ver nesta zona da cidade, e que encontro em bairros nobres de Paris, Londres ou Madrid e até Atenas.

    No seguimento dos jornais de fim-de-semana onde li que Maria José Nogueira Pinto à frente do projecto Baixa-Chiado quer retirar estas lojas das zonas potencialmente mais nobres disse: “Retirem sim as lojas chinesas do comércio tradicional da Baixa em decadência “, "MAS LIBERTEM OS PISOS TÉRREOS DO TERREIRO DO PAÇO E TRAGAM MAIS MARTINHOS DA ARCADA, PARA NÓS “PESSOAS” NACIONAIS E ESTRANGEIRAS VIVERMOS UMA CIDADE DIGNIFICANTEMENTE EUROPEIA." Esta era a ideia geral do meu texto.

    Posso concordar que as actividades lúdicas ao ar livre sirvam como penso rápido para aquilo que eu quero ver no Terreiro do Paço. Sei também que no nosso país tudo se move devagar, por isso sentir algum movimento penso sempre ser positivo ou o início de alguma coisa melhor.

    Imaginarei até morrer um Terreiro do Passo fechado ao transito, com esplanadas sem serem de plástico, concertos de Jazz ao fim da tarde, cultura e mais cultura libertando as galerias que estão erradamente ocupadas por órgãos do Governo.

    Legislação errada, de certo que sim. O problema continua a ser a média dos portugueses com interesses e energia positiva que querem fazer bom e bem está bastante longe da outra “massa” deste país.

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  3. Às vezes quando o sábio aponta para a lua, os tolos olham para o seu dedo.
    Parabéns pelo sentido do teu texto, que não se preocupou em ser politicamente correcto. A civilização e a cultura chinesa são fabulosas e fundamentais, mas as ditas lojas nada têm que ver com isso, nem o teu texto. Esse eram meramente sobre Lisboa.
    Um outro assunto: um destes dias falarás de livros, dos livros...

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