10 junho 2012
este blog transformou-se numa Plataforma Atlântica
porque mais do que nunca é preciso pensar 'grande' transformei este blog numa plataforma Atlântica www.acidadenapontadosdedos.com
agora estamos aqui.
28 maio 2012
o último post nesta morada
é despida de tudo que me fundo com a cidade.
despida de tudo e à procura de um país maior, nos actos e nos afectos. o encontro entre Lisboa e o Porto e a complementaridade que nos elevará a um país mais alto.
despeço-me deste blog despida de tudo, como quem recolhe humildade suficiente para continuar a entregar o que me move. esta paixão de ter nascido portuguesa.
porque dia 5 de Junho, pelas 19h estarei noutra morada agradeço a compreensão do meu silêncio nos dias que estão para vir.
25 maio 2012
Saída de Emergência Vogue l Há um apartamento em Lisboa
O serviço é rápido e agradável mas, na hora das sobremesas, o tabuleiro com as iguarias à vista rouba-me o mistério do pecado. Gosto de desejar o imaginável. De desejar o que ainda não se toca.
continue a ler a Saída de Emergência aqui.
24 maio 2012
a paixão é começo II
depois disto, a ideia do post it ganhou cor e inundou ontem a cidade, desta vez com ideias para Lisboa. as melhores concorrem aos 2,5 milhões de euros do Orçamento Participativo. gastaria muitos blocos de pos-its com todas as ideias que ainda tenho para a minha cidade, mas para o orçamento participativo elegi uma. novidades em breve.
22 maio 2012
18 maio 2012
Saída de Emergência Vogue l O Ritz Clube está de volta
Habituada à magia da noite, o carisma nocturno da Rua da Gloria reabre o Ritz Clube elevando a fasquia de uma Lisboa típica, castiça e misteriosa, a uma cidade que vai desabrochando lentamente. Bem perto da Avenida do glamour da cidade, o edifício construído em 1908 acolhe uma família de colaboradores que testemunho circular escada acima e escada a baixo. A vibração é de quem acredita e os sorrisos são suaves e gratuitos.
continue a ler a Saída de Emergência aqui.
16 maio 2012
GQ l à conversa com Scott Shuman, The Sartorialist
Scott Shuman esteve em Madrid e eu acompanhei a sessão fotográfica, num loft criado para o evento de lançamento do Xperia ray, o modelo da Sony Ericsson que o autor do blog thesartorialist.com - que com milhões de visualizações é hoje considerado um dos bloggers mais famosos do mundo - lançou na cidade ‘de la movida’. Ao lado de quase uma dezena de bloggers espanholas tive o privilégio de ser uma das portuguesas convidadas para o lançamento, o qual aceitei em troca de quinze minutos de conversa, que me permitiu escrever-vos estas linhas. Vivo sempre um misto de sentimentos sempre que entrevisto uma pessoa que admiro de alguma maneira. Porque se nos inspiram pelo talento ou pelos feitos, podem decepcionar a expectativa de quem os segue por uma personalidade moldada aos devaneios da fama, que deixa tantas nódoas. Para bem da minha expectativa, sempre grande em relação aos seres humanos, Scott Shuman ultrapassou qualquer receio, gravando para sempre um testemunho imenso de humildade e recolhi e partilho nestas páginas com gratidão.
Habituado a fotografar em cidades como Nova Iorque, Paris, Milão, Londres, Estocolmo ou Moscovo, Madrid acolheu com muito entusiasmo o homem da objectiva de rua. O cenário numa rua de uma madrilena mais típica construi-se num espaço, que pelas texturas e criatividade, poderia estar numa das divisões do nosso Lx Factory. Com quinze anos de muito trabalho no reino da moda e colaborador da GQ e Elle americanas, Fantastic Man ou revista Vogue francesa, Scott Shuman aceitou ser embaixador de um telemóvel pioneiro nos megapixéis e no design inspirado na natureza, uma palavra que já dispensa nos seus registos fotográficos. Como amante da naturalidade dos seres humanos que deambulam ou viajam pelas ruas da cidade, Scott Shuman troca as tendências das passagens de modelos, com o que as pessoas de facto usam no dia-a-dia. Assim nasceu o seu blog The Sartorialist, hoje considerado um pólo de tendências reais nos quatro cantos do mundo.
O estúdio retratava um ambiente de festa, uma mesa de amigos, ou numa conversa íntima de sofá, coloridos com os bloggers que deambulavam pelo estúdio enquanto Scott Shuman apanhava os momentos, com um estilo muito próprio, que mesmo na sua surpreendente baixa estatura fotografava como um homem elevado.
Assim foi a escolha da capa do seu livro editado e vendido em muitas livrarias do mundo, que transpira Julie, uma mulher sobriamente atraente de casaco verde e boina encarnada, que no seu olhar distante parece ter uma vida perfeita. Longe dessa realidade, a famosa mulher da capa do seu livro, a quem já chamaram a nova Audrey Hepburn – foi eleita pelo estilo, mas também por ter uma perna mais curta que a outra, braços excessivamente magros e a particularidade de coxear ao andar.
Com uma infância passada no Indiana, no meio dos Estados Unidos da América, onde não existe qualquer tipo de moda ou estilo, Scott Shuman cresceu a viajar e a sonhar através de revistas. Esse sentimento de procura e descoberta era muito forte e quando hoje em dia quando fotografa diz sentir o mesmo: ‘Eu não preciso de saber os factos… eu não quero saber os factos. Eu quero faze-lo sempre de maneira sonhadora e romântica, a maneira que como eu vejo as pessoas e daquilo que eu imagino delas’.
Abordei por isso a contradição que se revela como uma atracão fatal nas suas escolhas, que se revela sempre pela escolha do mistério. ’Quando fotografo uma pessoa na rua, não tenho de perceber tudo, não conheço, nem passo a conhecer a grande maioria das pessoas que fotografo e não acho que seja importante’. Na sua missão especial de captar tendências assume-me que a o trabalho é bem mais especial do que isso. ‘Eu não vou para a rua para caçar moda, marcas ou criadores e não estou interessado nos detalhes, mas antes nas pessoas que de alguma maneira me parecem interessantes. O que elas vestem não é o assunto principal e no final do dia, o que vejo no meu blog são imagens de pessoas’.
Sonhador convicto, confessa-me a rir, que tem a noção da importância de partilhar com o mundo muita gente bonita que encontra na rua. Acrescenta que tem sabedoria suficiente para saber que nem toda a gente que encontra é divertida ou maravilhosa na vida real, por isso guarda sempre alguma distância, sendo o momento do encontro com o viajante da cidade sempre muito breve. ‘Muitas das pessoas que fotografei jamais as verei de novo… e gosto deste mistério. E se por vezes as fotografias podem parecer revelar sobre a pessoa… é apenas sobre uma parte delas. É sobre o abstracto da ideia do que elas são. Para mim é mais estimulante e divertido dessa maneira porque é mais romântico e inspirador’.
No romantismo e na busca de inspiração pergunto-lhe o que sente pelas pessoas que fotografa. A resposta assenta-se na palavra respeito: ’fotografo-os com o mesmo respeito e dedicação com que fotografo os meus filhos e acho que o sucesso das fotografias se revela pela honestidade com que o faço. Pela expressão honesta que as consigo captar’. E confessa que mesmo achando que na vida é preciso confiança para seguirmos os nossos sonhos, é encanto que ele procura através da sua objectiva. ‘Mesmo os homens mais machos conseguem ter encanto. O homem da página trezentos e cinquenta e sete do meu livro parece um sem abrigo e ninguém diria que ele trabalha para a Ralph Laurent. Só descobri a sua profissão mais tarde e achei fascinante saber que é ele que compra as antiguidades para a casa Ralph Laurent’. Com uma assertividade eloquente nas escolhas e nas palavras é perspicácia que diz ter quando escolhe uma pessoa na rua.
Consciente e grato pelo caminho percorrido, partilha que quando se quer fazer alguma coisa grandiosa, é importante ter a noção que se navega num rio, não para ir apara esta ou aquela direcção, mas para nos deixarmos navegar até encontrar o que será uma margem elevada: ‘Quando era miúdo eu sabia que ia fazer alguma coisa importante, mas não sabia bem o que seria. Ao longo do caminho fui ajustando o que encontrava com aquilo que acreditava ser a minha grandeza. Quando estava na escola eu tive aulas de alfaiataria e design de padrões, mas logo nessa altura tive a perfeita noção que não seria um designer. Nunca imaginei ser fotógrafo, pois nunca tive aulas de fotografia. Comecei por fotografar os meus filhos, depois comecei a explorar como podia conjugar fotografia e moda e o que me movia era o que eu próprio pensava que seria a moda, a moda real, a moda viva nas ruas’.
Ao pegar o livro que pedi para assinar volta-me a falar da capa escolhida. A capa homenageia todos os que não deixam de expressar as bonitas pessoas que são, apesar das suas fragilidades estéticas ou físicas: ‘Há muita sinceridade em tudo o que faço. Os outros projectos servem para fazer dinheiro, o que me permite fazer o que mais gosto que é continuar a andar na rua a fotografar. Socialmente, o meu livro e o blog mostram outro tipo de pessoas… bem diferentes dos modelos jovens e frescos das revistas. Há pessoas a ir ao meu blog e a dizerem ‘eu quero parecer assim quando for mais velho’. 'Pela primeira vez os mais jovens estão-se a inspirar nos mais velhos que mantêm o encanto apesar da idade. E isto parece um detalhe, mas é muito importante. Mais do que moda ou estilo capturado, a ideia de poder retratar a elegância e nobreza do envelhecimento e poder tocar as pessoas é a minha maior riqueza’.
Na riqueza que foi também para mim conversar com Scott Shuman recolho a simpatia e o foco com que The Sartorialist partilha a humildade que conserva nas mãos e nos sonhos que ainda guarda. A promessa de visitar Lisboa, uma cidade do mundo, que também já não vive sem as tendências que Scott Shuman vai captando com sinceridade, pelas ruas da cidade.
crónica publicada na edição de Maio de 2012 na GQ
15 maio 2012
mais Terreiro do Paço
Lisboa está prestes a ganhar um novo espaço para eventos. O Torreão Nascente do Terreiro do Paço, com uma área total de 430 m2, que passará a estar disponível a partir 9 de Junho para eventos. Também a inauguração de um novo pólo comercial e cultural na Ala Nascente do Terreiro do Paço com cinco estabelecimentos de restauração e bebidas, uma loja de flores e um food court. Mais tarde, em Outubro, Lisboa passará a ter ainda um centro de interpretação dedicado à sua história, o ‘Lisboa Story Centre’. Todo o protejo foi desenvolvido pela Associação Turismo de Lisboa e CML, que pretende dinamizar a cidade para acompanhar o aumento do número de turistas como está previsto no Plano Estratégico para o Turismo de Lisboa 2011-2014. Não sei mais pormenores e mal saiba comunico. :-)
14 maio 2012
Lisboa, a cidade cénica
Na passada quarta-feira, o largo da Assembleia da República recebeu uma noite cénica. A projecção de um filme sobre os mais de cem anos do cinema português com montagem de mais de quatrocentas produções nacionais fez da noite de 9 de Maio um momento que que Lisboa deslumbrou como cidade cénica.
Mas mais do que uma noite deslumbrante na minha cidade estrondosa, a acção pretendeu sensibilizar a opinião publica para a urgência da proposta de lei do cinema. 'Enquanto o mérito do cinema português é aclamado nacional e internacionalmente, a realidade apresenta preocupação. O Instituto de Cinema e Audiovisual está em absoluta ruptura financeira. Estamos perante um corte de 100%, sem paralelo em mais nenhum sector de actividade. As produtoras e empresas associadas ficam na iminência de encerrar'.
A cultura é uma das colunas vertebrais de um povo. Sem cultura não somos nada. A cultura apazigua as ansiedades da alma, regista a memória de um povo. E que Lisboa é cénica já todos sabemos, mas para registo da sua história na transversalidade dos tempos, a arte do cinema é fundamental, não concordam?
13 maio 2012
'Seria muito infeliz se me dedicasse só à música'
pelas palavras da minha amiga Laurinda Alves,
a homenagem ao Bernardo Sassetti na Basilica da Estrela foi um momento inesquecível para todos os que estivemos presentes. Pedro Burmester e Mário Laginha tocaram com lágrimas e dor, paixão e entrega, algumas composições felizes do Bernardo. Muito comovente. A orquestra, os coros e os músicos da família que tocaram e cantaram com inspiração foram igualmente sublimes. A Basílica desabou em palmas durante longos minutos. Uma eternidade. O Bernardo encheu as nossas vidas de vida. E de música, claro. No fim encontrei uma família de amigos também eles muito próximos da família do Bernardo, que me passaram o link de uma entrevista que eu própria fiz ao Bernardo em 2006. Aqui fica.
entrevista à revista "XIS" saída com o PÚBLICO de 18 de Março de 2006
'Seria muito infeliz se me dedicasse só à música'
A sua música, inspirada e inspiradora, transborda de emoções. Não gosta da exposição mediática e protege-se dos excessos. Conserva a mesma pureza de coração que tinha quando começou a tocar e a compor. Enche plateias e é sempre aplaudido de pé.
Está com um ar tranquilo e feliz. De onde vem a sua felicidade?
De muitas coisas... Dos projectos muito entusiasmantes que tenho pela frente, mas acima de tudo por ter encontrado o equilíbrio entre o trabalho e a coisa mais importante na vida, que é a família.
Fala do amor?
Sim, naturalmente do amor e da partilha. Mas penso mais do que falo. Tem sido muito importante para mim a paternidade, olhar para as minhas filhas e perceber muito mais coisas da vida. Elas ajudam-me a relativizar outras que me preocupavam no passado.
O que é que mais o fascina na paternidade?
O que me fascina realmente é tudo o que já foi escrito de bom, de positivo e de construtivo, mas há um aspecto que eu gosto muito, que é rever-me naqueles seres tão fascinantes e que me podem ensinar tanto. Através das minhas filhas consigo, pela primeira vez na minha vida, ter tempo para pensar um bocado nas memórias que tenho do passado e que muitas vezes esqueci. A memória dos tempos familiares e das coisas que me aconteceram na infância. É bom chegar a um ponto da nossa vida em que percebemos que o trabalho é interessante mas existem coisas muito mais importantes.
O trabalho não nos completa como seres humanos?
De maneira nenhuma.
Trabalha muito?
Sim, mas seria muito infeliz se me dedicasse só à música ou ao trabalho. Chega a ser angustiante, porque a música é uma forma de representação de qualquer coisa que está cá dentro. Do imaginário abstracto ou de memórias que não consigo exprimir por palavras. Isto parece-me evidente para qualquer pessoa que se dedique à composição.
Fala de memórias e dessa massa abstracta que são os sentimentos e as emoções?
Exactamente. O que acontece é que este processo de desenvolvimento musical relativo à nossa vida pode ser muito angustiante e, sobretudo, pode fazer de nós seres desumanos. Há uma expressão muito engraçada que é o "Bernardo eremita" que é um ser que se esconde numa concha e sobrevive sozinho.
Alguma vez se sentiu "Bernardo eremita"?
Sim, na altura da minha aprendizagem. Hoje estou cada vez mais convencido de que tinha interesses muito especiais relativamente às pessoas com quem me dava e sei que vivi com uma obsessão durante anos: aprender não só a linguagem musical mas, sobretudo, a linguagem do jazz que é tão difícil em Portugal. Conseguir ter acesso à informação naquela altura, nos princípios dos anos 80, não foi nada fácil.
Quantos anos tinha?
Comecei, realmente, com 14 anos.
Fala em obsessão e gostava que explicasse melhor porque usa essa expressão.
Pois, é um bocado forte mas às vezes utilizo termos que podem parecer excessivos. Era uma obsessão porque eu vivia com as imagens daqueles sons diariamente. Não só ao piano, sozinho, como na rua a ir para o liceu. Vivia diariamente com a ideia de que um dia ia conseguir tocar aquela música.
Que música era essa? Era só o jazz que já conhecia ou era a música que tinha dentro de si?
Acho que eram as duas mas, nessa altura, eu não tinha capacidade para pensar muito bem naquilo que queria. Até cheguei a uma fase em que me apetecia desistir da música. Foi num período em que estagnei um bocado. Era preciso dar um salto qualquer.
Quantos anos de estudo musical já tinha?
Cinco anos, mais ou menos. A minha forma de estudar foi muito pouco ortodoxa porque tive sempre professores particulares.
Foi uma aposta do seu pai ou da sua mãe?
Foi uma aposta que eu decidi enfrentar. A música sempre fez parte da vida daquela casa, dos meus irmãos e, sobretudo, do meu pai. Ele sempre tentou transmitirnos o gosto pela música e pela sua compreensão. Lembro-me de passar muitas horas sentado ao lado do meu pai com ele a explicar-me a música e o contexto de algumas óperas enquanto eu via e seguia partituras muito antigas que tinha lá em casa.
E isso era feito em esforço?
Era fascinante e até era iniciativa minha. Depois, naturalmente, vieram os ensinamentos do meu pai. Tudo isso faz parte das minhas memórias de família.Quem é que percebeu primeiro que tinha um grande talento?
Ninguém...
Até hoje ninguém? [risos]
Era difícil, sabe?! Levou muito tempo a todas as pessoas da minha família, pais e irmãos, a perceber que a música já fazia parte da minha vida.
Quantos são ao todo?
Somos oito irmãos. O meus pais têm 25 netos. Somos uma família grande.
Todos ligados à música?
Não, só o meu irmão Francisco, também em piano. Os meus outros irmãos têm profissões sérias [risos].
O seu pai tocava?
Não tocava mas sabia e sabe muito de música.
Tem bom ouvido também?
Muito bom ouvido e uma memória invejável das coisas, dos lugares e de textos que leu há mais de 50 anos. Tudo isso se nota na forma como ele nos transmite as coisas e os conhecimentos.
Voltando à questão que ficou por responder, quem percebeu primeiro que tinha talento?
Não sei, realmente não sei, porque aquela música era uma novidade naquela casa. O jazz era uma música pouco ouvida e realmente eu sempre quis apostar e lancei-me mesmo para a frente, quase até cair!
Ainda hoje o jazz não é uma música fácil para os portugueses, pois não?
É difícil em qualquer parte. É preciso tempo para a compreender. E, depois, também acho que a música hoje em dia aparece diariamente nas nossas vidas de uma forma inexplicavelmente banal.
Ou seja?
Está em toda a parte. Façamos nós o que fizermos teremos sempre música a acompanhar... qualquer coisa! Música na rua, música nas lojas, nos elevadores, nos aeroportos, em viagem. Há música a mais para dar, emprestar ou vender.
E essa banalização perturba ou recria a própria música?
Eu acho que é muito perturbante, especialmente para um músico. Até na forma como a música é ouvida, muitas vezes aos altos berros, transforma-a facilmente em poluição sonora.
Distorce o valor da própria música?
Claro, é como tudo o que se banaliza em excesso. Hoje em dia também se escolheu o sexo, por exemplo, como forma fácil de chegar às pessoas. O sexo ligado ao amor, à partilha e à entrega entre duas pessoas tem tanto de grandioso como pode ter de banal, pela forma simplista como hoje nos é exposto.
É interessante este salto que deu agora da música, que é sagrada para si, para o sexo e para a relação a dois. A música e o amor com entrega são o que há de mais sagrado para si?
Completamente. Fiz este paralelismo porque são coisas sagradas mas muito banalizadas. Hoje em dia escolheu-se banalizar o sexo. O sexo já não é tabu e fala-se dele como se fala de uma refeição de fast food.
E isso perturba-o?
Muito, porque são elementos na nossa vida que são especiais. São cantinhos muito especiais da nossa vida, que devemos preservar. O mais importante para mim é o equilíbrio das coisas.
Consegue ter um discurso afectivo mas não moralizante.
Ainda bem. As pessoas fazem da vida o que quiserem, vêem o que quiserem e seguem o que entenderem.
Mas você preferiu fazer do amor e do sexo um cantinho sagrado da sua intimidade.
Sim, completamente. É muito difícil, senão impossível, conceberme numa situação de sexo sem amor.
Diz isso também por pertencer a uma família católica?
Não, de maneira nenhuma. Digoo porque é mesmo o que penso e sinto. Tive uma educação católica, que respeito, mas tenho a minha própria fé e não sou um praticante exemplar. Faço-o à minha maneira.
É mais pela ética do que pela religião, digamos assim?
Sim. Os princípios éticos acompanham a minha vida sem que eu tenha de pensar muito sobre eles ou identificar a religião à qual pertencem. São princípios positivos em que acredito.
Mas quem o ouve e quem o conhece sente que há uma mística na sua música e na sua atitude na vida. Qualquer coisa de profundamente espiritual. Você é uma pessoa espiritual?
Acho que sou uma pessoa comum e tento procurar cada vez mais o essencial na música que faço. É curioso pensar que muitas vezes as pessoas confundem a espiritualidade com a tristeza. Um tema lento, por exemplo, não tem que ser necessariamente triste. Eu não acredito em tristeza na minha música. Há quem diga que o Ascent ou o Alice são músicas profundamente tristes mas eu retirava a palavra triste.
E classificaria como?
Acho que é, de facto, uma procura interior minha, uma procura dos sons e de uma representação de qualquer coisa que tenha a ver com a minha vida, com o meu interior e isso, no meu entender, afasta-se muito do sentido de tristeza.
É uma coisa intensa e verdadeira, mas não necessariamente triste?
Intensa é, verdadeira não sei, nem posso saber com certezas... O que acontece é que existem várias formas de energia que têm muito a ver com esse lado espiritual que mencionou há bocado, mas para mim não há nada mais precioso do que o silêncio de uma meditação. Olharmos para dentro e pensarmos em quem somos e o que estamos aqui a fazer. Isso é muito importante. Eu considero muitas vezes que a música que faço é inútil para os outros, sinto-me muito pequeno no universo artístico, apesar de o viver intensamente todos os dias.
Sabe que tem feito muito pelo jazz, pois as pessoas identificam o jazz e o piano consigo. De alguma forma você arredondou as arestas que o jazz tinha nos nossos ouvidos. Hoje em dia todos o ouvimos com imenso prazer, mesmo quando toca aquilo de que nem todos gostamos.
Eu tenho consciência de que existem pessoas que seguem a minha música e isso é-me muito gratificante. Mas, realmente, isto é uma questão difícil de explicar porque, como pessoa e como músico, sinto-me mesmo muito pequeno. Quero dizer, muitas vezes tenho dificuldade em acreditar que a minha música possa chegar realmente às pessoas e é por isso que falo da inutilidade da música que componho e interpreto, embora isso não queira dizer que não haja pessoas que não se identifiquem com a minha música.
Só se sente pequeno quem é verdadeiramente grande. É uma coisa que vem nos livros.
Pois, o que hei-de dizer sobre isso? Nada, mas tem tido muitas provas de reconhecimento do seu talento. De cada vez que dá um concerto e o aplaudem tem de sentir isto... Digamos que não sou a pessoa indicada para falar sobre isso...
Até uma certa altura a sua música era uma espécie de sequência, uma evolução dentro de uma linha muito definida, mas agora com estes dois últimos discos, e especialmente com o Alice, que é uma musica feita para um filme denso e triste, a sua música tomou outros caminhos?
Neste momento, a música que componho está muito ligada ao cinema, à imagem e à fotografia, que são as artes visuais que mais me acompanham. Interessa-me imenso tentar compreender o poder de sedução das imagens. Gosto também da ideia de histórias contadas em três partes e existe, de facto, uma técnica e uma evolução muito interessante na história do cinema. Há um aspecto decisivo que é a montagem moderna de um filme. As histórias contadas através de pequenos fragmentos que se vão juntando. É interessante transpor estas ideias para a música.
O que faz com que a música seja um bocadinho mais avulsa, também?
O meu interesse na música é tentar contar uma história, tanto na comunicação com os músicos como com o público, porque é uma comunicação totalmente feita no momento, apesar de ensaiarmos os temas principais. O improviso é qualquer coisa de tão espontâneo que talvez seja um dos grandes exemplos de humanidade na música. Quero dizer, é uma sensação de desafio constante em que todos nós estamos a tentar pôr cá para fora as nossas coisas do passado e do presente, e isso é muito enriquecedor e sempre diferente.
Como foi o processo de criação da música para o filme Alice?
O Alice foi muito especial. Tive um contacto muito forte com o realizador Marco Martins. Fui à procura das notas do tema e das entradas de música na presença do Marco e foi a primeira vez que isso aconteceu ao longo das dez bandas sonoras que compus até hoje.
O facto de Alice ser um filme tão intenso, tão duro, que conta a história de uma filha que desaparece e nunca mais aparece, que ninguém sabe se está viva, se está morta, tocou-o muito?
E de que maneira! Foi um processo muito doloroso, aliás como escrevi no texto para o CD. Foi muito marcante e tive de viver com aquelas imagens durante muitas semanas, enquanto procurava as notas do tema principal.
Chorou?
Sim, isso chegou a acontecer algumas vezes. E chorava pela história, pelo esforço criativo, ou chorava quando olhava para a sua fi lha? Chorava quando eu próprio começava a meditar com a música, quando conseguia estar realmente sozinho com a música e, no fundo, com o sentido real deste filme. Tudo aquilo é uma dor muito poderosa e espero nunca passar por isso, pois é inimaginável para uma pessoa que tem filhos a ideia da perda ou da morte de um filho. Pior do que a certeza da morte é a incerteza do desaparecimento... Penso que é preciso ter muita fé e muita força para lidar tanto com o desaparecimento como com a morte. No caso de Alice, tentei encontrar um equilíbrio entre a música que, de alguma forma, mostrasse essa angústia.Há partes muito angustiantes naquela banda sonora e a inserção de alguns sons violentos da cidade pareceu-me apropriada.
É como uma coisa que grita no meio da música?
Sem dúvida. Lá longe, aparece a nota de um clarinete como se fosse a voz da Alice, sempre presente mesmo estando desaparecida. O que tentei fazer foi encontrar o equilíbrio entre a angústia de um pai, o desespero de uma mãe, a procura e a esperança. Foi isso que me deu muita força para escrever aquela banda sonora. Agora estou a trabalhar muito nela porque vou fazer o Alice num espectáculo ao vivo no Teatro Maria Matos, no dia 6 de Abril. No dia 31 de Março é o Ascent, no São Luiz.
Ao longo destes anos todos o que é que aprendeu sobre si próprio através da música?
Essa pergunta é muito difícil. Acho que aprendi que existe em mim um lado egocêntrico muito forte. Quando fazemos música que tentamos que seja, não totalmente mas de alguma forma, verdadeira, isso faz-nos centrar em nós próprios.
Fala de música com verdade e isso remete para a lendária questão de saber o que é a verdade?
Isso será sempre uma questão filosófica difícil de definir e compreender. Aprendi que a contenção é a palavra-chave nesta fase da minha vida. Já senti a música como um divertimento ou uma distracção para as pessoas mas, neste momento, a coisa mudou totalmente de figura.
Como é que a define agora?
Exactamente como uma necessidade emocional muito forte de transmitir coisas que tenho cá dentro. Coisas que nunca conseguirei expressar por palavras. É difícil explicar, sabe?! Percebe-se o que quer dizer. Muitas vezes sinto a música como se de um desabafo se tratasse.
Existe fracasso e dor nesse desabafo?
Existe tudo. Tento assumir permanentemente o erro e a indecisão, a dúvida constante. Procuro fazer isso pois também faz com que a minha visão das coisas possa evoluir. Nesse sentido, o conflito interior é e será sempre essencial.
a homenagem ao Bernardo Sassetti na Basilica da Estrela foi um momento inesquecível para todos os que estivemos presentes. Pedro Burmester e Mário Laginha tocaram com lágrimas e dor, paixão e entrega, algumas composições felizes do Bernardo. Muito comovente. A orquestra, os coros e os músicos da família que tocaram e cantaram com inspiração foram igualmente sublimes. A Basílica desabou em palmas durante longos minutos. Uma eternidade. O Bernardo encheu as nossas vidas de vida. E de música, claro. No fim encontrei uma família de amigos também eles muito próximos da família do Bernardo, que me passaram o link de uma entrevista que eu própria fiz ao Bernardo em 2006. Aqui fica.
entrevista à revista "XIS" saída com o PÚBLICO de 18 de Março de 2006
'Seria muito infeliz se me dedicasse só à música'
A sua música, inspirada e inspiradora, transborda de emoções. Não gosta da exposição mediática e protege-se dos excessos. Conserva a mesma pureza de coração que tinha quando começou a tocar e a compor. Enche plateias e é sempre aplaudido de pé.
Está com um ar tranquilo e feliz. De onde vem a sua felicidade?
De muitas coisas... Dos projectos muito entusiasmantes que tenho pela frente, mas acima de tudo por ter encontrado o equilíbrio entre o trabalho e a coisa mais importante na vida, que é a família.
Fala do amor?
Sim, naturalmente do amor e da partilha. Mas penso mais do que falo. Tem sido muito importante para mim a paternidade, olhar para as minhas filhas e perceber muito mais coisas da vida. Elas ajudam-me a relativizar outras que me preocupavam no passado.
O que é que mais o fascina na paternidade?
O que me fascina realmente é tudo o que já foi escrito de bom, de positivo e de construtivo, mas há um aspecto que eu gosto muito, que é rever-me naqueles seres tão fascinantes e que me podem ensinar tanto. Através das minhas filhas consigo, pela primeira vez na minha vida, ter tempo para pensar um bocado nas memórias que tenho do passado e que muitas vezes esqueci. A memória dos tempos familiares e das coisas que me aconteceram na infância. É bom chegar a um ponto da nossa vida em que percebemos que o trabalho é interessante mas existem coisas muito mais importantes.
O trabalho não nos completa como seres humanos?
De maneira nenhuma.
Trabalha muito?
Sim, mas seria muito infeliz se me dedicasse só à música ou ao trabalho. Chega a ser angustiante, porque a música é uma forma de representação de qualquer coisa que está cá dentro. Do imaginário abstracto ou de memórias que não consigo exprimir por palavras. Isto parece-me evidente para qualquer pessoa que se dedique à composição.
Fala de memórias e dessa massa abstracta que são os sentimentos e as emoções?
Exactamente. O que acontece é que este processo de desenvolvimento musical relativo à nossa vida pode ser muito angustiante e, sobretudo, pode fazer de nós seres desumanos. Há uma expressão muito engraçada que é o "Bernardo eremita" que é um ser que se esconde numa concha e sobrevive sozinho.
Alguma vez se sentiu "Bernardo eremita"?
Sim, na altura da minha aprendizagem. Hoje estou cada vez mais convencido de que tinha interesses muito especiais relativamente às pessoas com quem me dava e sei que vivi com uma obsessão durante anos: aprender não só a linguagem musical mas, sobretudo, a linguagem do jazz que é tão difícil em Portugal. Conseguir ter acesso à informação naquela altura, nos princípios dos anos 80, não foi nada fácil.
Quantos anos tinha?
Comecei, realmente, com 14 anos.
Fala em obsessão e gostava que explicasse melhor porque usa essa expressão.
Pois, é um bocado forte mas às vezes utilizo termos que podem parecer excessivos. Era uma obsessão porque eu vivia com as imagens daqueles sons diariamente. Não só ao piano, sozinho, como na rua a ir para o liceu. Vivia diariamente com a ideia de que um dia ia conseguir tocar aquela música.
Que música era essa? Era só o jazz que já conhecia ou era a música que tinha dentro de si?
Acho que eram as duas mas, nessa altura, eu não tinha capacidade para pensar muito bem naquilo que queria. Até cheguei a uma fase em que me apetecia desistir da música. Foi num período em que estagnei um bocado. Era preciso dar um salto qualquer.
Quantos anos de estudo musical já tinha?
Cinco anos, mais ou menos. A minha forma de estudar foi muito pouco ortodoxa porque tive sempre professores particulares.
Foi uma aposta do seu pai ou da sua mãe?
Foi uma aposta que eu decidi enfrentar. A música sempre fez parte da vida daquela casa, dos meus irmãos e, sobretudo, do meu pai. Ele sempre tentou transmitirnos o gosto pela música e pela sua compreensão. Lembro-me de passar muitas horas sentado ao lado do meu pai com ele a explicar-me a música e o contexto de algumas óperas enquanto eu via e seguia partituras muito antigas que tinha lá em casa.
E isso era feito em esforço?
Era fascinante e até era iniciativa minha. Depois, naturalmente, vieram os ensinamentos do meu pai. Tudo isso faz parte das minhas memórias de família.Quem é que percebeu primeiro que tinha um grande talento?
Ninguém...
Até hoje ninguém? [risos]
Era difícil, sabe?! Levou muito tempo a todas as pessoas da minha família, pais e irmãos, a perceber que a música já fazia parte da minha vida.
Quantos são ao todo?
Somos oito irmãos. O meus pais têm 25 netos. Somos uma família grande.
Todos ligados à música?
Não, só o meu irmão Francisco, também em piano. Os meus outros irmãos têm profissões sérias [risos].
O seu pai tocava?
Não tocava mas sabia e sabe muito de música.
Tem bom ouvido também?
Muito bom ouvido e uma memória invejável das coisas, dos lugares e de textos que leu há mais de 50 anos. Tudo isso se nota na forma como ele nos transmite as coisas e os conhecimentos.
Voltando à questão que ficou por responder, quem percebeu primeiro que tinha talento?
Não sei, realmente não sei, porque aquela música era uma novidade naquela casa. O jazz era uma música pouco ouvida e realmente eu sempre quis apostar e lancei-me mesmo para a frente, quase até cair!
Ainda hoje o jazz não é uma música fácil para os portugueses, pois não?
É difícil em qualquer parte. É preciso tempo para a compreender. E, depois, também acho que a música hoje em dia aparece diariamente nas nossas vidas de uma forma inexplicavelmente banal.
Ou seja?
Está em toda a parte. Façamos nós o que fizermos teremos sempre música a acompanhar... qualquer coisa! Música na rua, música nas lojas, nos elevadores, nos aeroportos, em viagem. Há música a mais para dar, emprestar ou vender.
E essa banalização perturba ou recria a própria música?
Eu acho que é muito perturbante, especialmente para um músico. Até na forma como a música é ouvida, muitas vezes aos altos berros, transforma-a facilmente em poluição sonora.
Distorce o valor da própria música?
Claro, é como tudo o que se banaliza em excesso. Hoje em dia também se escolheu o sexo, por exemplo, como forma fácil de chegar às pessoas. O sexo ligado ao amor, à partilha e à entrega entre duas pessoas tem tanto de grandioso como pode ter de banal, pela forma simplista como hoje nos é exposto.
É interessante este salto que deu agora da música, que é sagrada para si, para o sexo e para a relação a dois. A música e o amor com entrega são o que há de mais sagrado para si?
Completamente. Fiz este paralelismo porque são coisas sagradas mas muito banalizadas. Hoje em dia escolheu-se banalizar o sexo. O sexo já não é tabu e fala-se dele como se fala de uma refeição de fast food.
E isso perturba-o?
Muito, porque são elementos na nossa vida que são especiais. São cantinhos muito especiais da nossa vida, que devemos preservar. O mais importante para mim é o equilíbrio das coisas.
Consegue ter um discurso afectivo mas não moralizante.
Ainda bem. As pessoas fazem da vida o que quiserem, vêem o que quiserem e seguem o que entenderem.
Mas você preferiu fazer do amor e do sexo um cantinho sagrado da sua intimidade.
Sim, completamente. É muito difícil, senão impossível, conceberme numa situação de sexo sem amor.
Diz isso também por pertencer a uma família católica?
Não, de maneira nenhuma. Digoo porque é mesmo o que penso e sinto. Tive uma educação católica, que respeito, mas tenho a minha própria fé e não sou um praticante exemplar. Faço-o à minha maneira.
É mais pela ética do que pela religião, digamos assim?
Sim. Os princípios éticos acompanham a minha vida sem que eu tenha de pensar muito sobre eles ou identificar a religião à qual pertencem. São princípios positivos em que acredito.
Mas quem o ouve e quem o conhece sente que há uma mística na sua música e na sua atitude na vida. Qualquer coisa de profundamente espiritual. Você é uma pessoa espiritual?
Acho que sou uma pessoa comum e tento procurar cada vez mais o essencial na música que faço. É curioso pensar que muitas vezes as pessoas confundem a espiritualidade com a tristeza. Um tema lento, por exemplo, não tem que ser necessariamente triste. Eu não acredito em tristeza na minha música. Há quem diga que o Ascent ou o Alice são músicas profundamente tristes mas eu retirava a palavra triste.
E classificaria como?
Acho que é, de facto, uma procura interior minha, uma procura dos sons e de uma representação de qualquer coisa que tenha a ver com a minha vida, com o meu interior e isso, no meu entender, afasta-se muito do sentido de tristeza.
É uma coisa intensa e verdadeira, mas não necessariamente triste?
Intensa é, verdadeira não sei, nem posso saber com certezas... O que acontece é que existem várias formas de energia que têm muito a ver com esse lado espiritual que mencionou há bocado, mas para mim não há nada mais precioso do que o silêncio de uma meditação. Olharmos para dentro e pensarmos em quem somos e o que estamos aqui a fazer. Isso é muito importante. Eu considero muitas vezes que a música que faço é inútil para os outros, sinto-me muito pequeno no universo artístico, apesar de o viver intensamente todos os dias.
Sabe que tem feito muito pelo jazz, pois as pessoas identificam o jazz e o piano consigo. De alguma forma você arredondou as arestas que o jazz tinha nos nossos ouvidos. Hoje em dia todos o ouvimos com imenso prazer, mesmo quando toca aquilo de que nem todos gostamos.
Eu tenho consciência de que existem pessoas que seguem a minha música e isso é-me muito gratificante. Mas, realmente, isto é uma questão difícil de explicar porque, como pessoa e como músico, sinto-me mesmo muito pequeno. Quero dizer, muitas vezes tenho dificuldade em acreditar que a minha música possa chegar realmente às pessoas e é por isso que falo da inutilidade da música que componho e interpreto, embora isso não queira dizer que não haja pessoas que não se identifiquem com a minha música.
Só se sente pequeno quem é verdadeiramente grande. É uma coisa que vem nos livros.
Pois, o que hei-de dizer sobre isso? Nada, mas tem tido muitas provas de reconhecimento do seu talento. De cada vez que dá um concerto e o aplaudem tem de sentir isto... Digamos que não sou a pessoa indicada para falar sobre isso...
Até uma certa altura a sua música era uma espécie de sequência, uma evolução dentro de uma linha muito definida, mas agora com estes dois últimos discos, e especialmente com o Alice, que é uma musica feita para um filme denso e triste, a sua música tomou outros caminhos?
Neste momento, a música que componho está muito ligada ao cinema, à imagem e à fotografia, que são as artes visuais que mais me acompanham. Interessa-me imenso tentar compreender o poder de sedução das imagens. Gosto também da ideia de histórias contadas em três partes e existe, de facto, uma técnica e uma evolução muito interessante na história do cinema. Há um aspecto decisivo que é a montagem moderna de um filme. As histórias contadas através de pequenos fragmentos que se vão juntando. É interessante transpor estas ideias para a música.
O que faz com que a música seja um bocadinho mais avulsa, também?
O meu interesse na música é tentar contar uma história, tanto na comunicação com os músicos como com o público, porque é uma comunicação totalmente feita no momento, apesar de ensaiarmos os temas principais. O improviso é qualquer coisa de tão espontâneo que talvez seja um dos grandes exemplos de humanidade na música. Quero dizer, é uma sensação de desafio constante em que todos nós estamos a tentar pôr cá para fora as nossas coisas do passado e do presente, e isso é muito enriquecedor e sempre diferente.
Como foi o processo de criação da música para o filme Alice?
O Alice foi muito especial. Tive um contacto muito forte com o realizador Marco Martins. Fui à procura das notas do tema e das entradas de música na presença do Marco e foi a primeira vez que isso aconteceu ao longo das dez bandas sonoras que compus até hoje.
O facto de Alice ser um filme tão intenso, tão duro, que conta a história de uma filha que desaparece e nunca mais aparece, que ninguém sabe se está viva, se está morta, tocou-o muito?
E de que maneira! Foi um processo muito doloroso, aliás como escrevi no texto para o CD. Foi muito marcante e tive de viver com aquelas imagens durante muitas semanas, enquanto procurava as notas do tema principal.
Chorou?
Sim, isso chegou a acontecer algumas vezes. E chorava pela história, pelo esforço criativo, ou chorava quando olhava para a sua fi lha? Chorava quando eu próprio começava a meditar com a música, quando conseguia estar realmente sozinho com a música e, no fundo, com o sentido real deste filme. Tudo aquilo é uma dor muito poderosa e espero nunca passar por isso, pois é inimaginável para uma pessoa que tem filhos a ideia da perda ou da morte de um filho. Pior do que a certeza da morte é a incerteza do desaparecimento... Penso que é preciso ter muita fé e muita força para lidar tanto com o desaparecimento como com a morte. No caso de Alice, tentei encontrar um equilíbrio entre a música que, de alguma forma, mostrasse essa angústia.Há partes muito angustiantes naquela banda sonora e a inserção de alguns sons violentos da cidade pareceu-me apropriada.
É como uma coisa que grita no meio da música?
Sem dúvida. Lá longe, aparece a nota de um clarinete como se fosse a voz da Alice, sempre presente mesmo estando desaparecida. O que tentei fazer foi encontrar o equilíbrio entre a angústia de um pai, o desespero de uma mãe, a procura e a esperança. Foi isso que me deu muita força para escrever aquela banda sonora. Agora estou a trabalhar muito nela porque vou fazer o Alice num espectáculo ao vivo no Teatro Maria Matos, no dia 6 de Abril. No dia 31 de Março é o Ascent, no São Luiz.
Ao longo destes anos todos o que é que aprendeu sobre si próprio através da música?
Essa pergunta é muito difícil. Acho que aprendi que existe em mim um lado egocêntrico muito forte. Quando fazemos música que tentamos que seja, não totalmente mas de alguma forma, verdadeira, isso faz-nos centrar em nós próprios.
Fala de música com verdade e isso remete para a lendária questão de saber o que é a verdade?
Isso será sempre uma questão filosófica difícil de definir e compreender. Aprendi que a contenção é a palavra-chave nesta fase da minha vida. Já senti a música como um divertimento ou uma distracção para as pessoas mas, neste momento, a coisa mudou totalmente de figura.
Como é que a define agora?
Exactamente como uma necessidade emocional muito forte de transmitir coisas que tenho cá dentro. Coisas que nunca conseguirei expressar por palavras. É difícil explicar, sabe?! Percebe-se o que quer dizer. Muitas vezes sinto a música como se de um desabafo se tratasse.
Existe fracasso e dor nesse desabafo?
Existe tudo. Tento assumir permanentemente o erro e a indecisão, a dúvida constante. Procuro fazer isso pois também faz com que a minha visão das coisas possa evoluir. Nesse sentido, o conflito interior é e será sempre essencial.
11 maio 2012
Bernardo Sassetti 1970 - 2012
não consigo dizer quase nada. é uma enorme perda e enquanto vos escrevo estas linhas as minhas mãos voltam a tremer pela fragilidade da vida. pelo valor que ela tem a cada dia que acordamos... tudo o que tocamos e o que fica por dizer. aqui fica a minha homenagem a um homem que deu tanta dignidade à sua vida. Obrigada por tudo o que nos deixas Bernardo.
'depois destes últimos anos mais dedicados a escrever música para cinema, decidi fazer uma pausa nesta actividade e dedicar-me ao jazz e à música de concerto. Os 4 últimos anos trouxeram-me mais experiência na relação da música escrita para imagens, passei momentos de grande intensidade em cada projecto e tenho consciência de que esta constante aprendizagem e o pensamento por detrás das notas escritas podem ser muito significativos para os meus próximos anos'
mais aqui e aqui.
'depois destes últimos anos mais dedicados a escrever música para cinema, decidi fazer uma pausa nesta actividade e dedicar-me ao jazz e à música de concerto. Os 4 últimos anos trouxeram-me mais experiência na relação da música escrita para imagens, passei momentos de grande intensidade em cada projecto e tenho consciência de que esta constante aprendizagem e o pensamento por detrás das notas escritas podem ser muito significativos para os meus próximos anos'
mais aqui e aqui.
Lisbon StartUp City, 'é como viver num postal'
como diz um dos testemunhos, o americano Jesse Biroskac 'é como viver num postal'....por tudo o que é partilhado neste filme, nunca tive dúvidas da minha cidade. a nossa cidade é mesmo um espanto. alguém tem dúvidas? ;-)
Vogue Saída de Emergência l O mais bem escondido café de Lisboa
Chego à hora de abertura e enquanto nas salas do palácio a mais exuberante Lisboa acontece, Nuno abre os panos do Club Café. Amante das artes cénicas e com grande energia prepara a chegada dos turistas, que já exploram a zona do Castelo no segundo dia de verão do ano. Dois viajantes do Rio de Janeiro pedem uma água e comentam que o espaço é bonito. Eu concordo.
continue a ler a Saída de Emergência aqui.
vão ser lançados hoje 'mil balões, mil ideias por Lisboa'
é já esta tarde que vão ser lançados na Praça do Município 1.000 por 1.000 ideias para a minha querida Lisboa. basta aparecer, escrever e fazer voar a sua ideia empreendedora.
a abertura do Evento vai estar a cargo da Vereadora Graça Fonseca e Dr. Paulo Soeiro Carvalho, Director Municipal de Economia e Inovação. Os balões utilizados são 100% biodegradáveis.
mais aqui. apareçam!
a Vogue online fez um ano
e eu juro que não bebi nada para conseguir gravar sozinha os parabéns ;-).
09 maio 2012
recicl'arte
A Sociedade Ponto Verde acaba de lançar um desafio aos criativos nacionais, com o objetivo de encontrar a solução mais criativa de decoração dos três sacos que constituem o conjunto de ecobags para separação selectiva de embalagens (azul, amarelo e verde).
A ideia é tornar estes objetos mais interessantes, de forma a que as pessoas também se sintam tentadas a separar cada vez mais as suas embalagens usadas, como os pacotes de Leite, embalagens de detergente ou de enlatados.
O vencedor deste concurso verá a sua criação e assinatura impressas em 100 mil unidades de ecobags e receberá um prémio pecuniário no valor de 2.500 euros. O Recicl’Arte decorre até 31 de Maio.
saiba tudo aqui.
A ideia é tornar estes objetos mais interessantes, de forma a que as pessoas também se sintam tentadas a separar cada vez mais as suas embalagens usadas, como os pacotes de Leite, embalagens de detergente ou de enlatados.
O vencedor deste concurso verá a sua criação e assinatura impressas em 100 mil unidades de ecobags e receberá um prémio pecuniário no valor de 2.500 euros. O Recicl’Arte decorre até 31 de Maio.
saiba tudo aqui.
08 maio 2012
07 maio 2012
6 meses depois, imagens da Montra Humana 'a partilha'
como magia pura, e graças à boa vontade de um homem de bem, ao fim de seis meses consegui recuperar as fotografias da Montra Humana que mais gozo me deu na história de amor e de entrega que tenho pela minha cidade. foi de longe um dos projetos mais bonitos que ofereci a Lisboa sem fins lucrativos, elevando os valores mais sentidos do mês de Natal.
Agradeço a todos os parceiros que tornaram estes dias inesquecíveis (Fabrico Infinito, The Decadente, Espaço B, Vinhos Fiuza, Jacobs Creek Sparkeling, Kitchen Aid, M.A.C., Nespresso, Paris Sete, Smeg e Niu, em especial à Cristiana e ao Rui Vaz Franco da Love is my Favorite Color que foram um testemunho de ultrapassar todas as adversidades da noite e a boa vontade da Data Recovery. Lab que permitiu o acesso a estas imagens. Com um serviço low cost de recuperação de dados de dispositivos electrónicos, discos rígidos, sistemas RAID, cartões de memória e pen USB, sem a sua magia seria impossível recordar.
Todas as imagens da Montra Humana 'a partilha' aqui.
datarecoverylab.pt e facebook aqui.
'No Reservations' de Anthony Bourdain sobre Lisboa
tenho a certeza que seria possível típico com cenários bem mais bonitos (lembro-me do típico que ele filmou em Itália ou na Grécia) e faltaram os pastéis de Belém não concordam? ;-) já a Bica ficou linda.
05 maio 2012
por quem nos guia
o dia da Mãe é já amanhã. neste anuncio de 1967, os meus pais (no primeiro dos anúncios em baixo) recém casados guiam um Morris 1100. na certeza que qualquer estrela guia implica uma escolha pessoal, é inundada de tudo que agradeço a incondicionalidade da família e a grande descoberta destes anúncios delirantes em gavetas mais antigas.
(Quito e Guingas Hipólito Raposo)
(à esquerda Marta Leitão Anahory e Jaime Anahory em pé)
04 maio 2012
na senda da Atlanticidade
devo um pedido de desculpas aos meus leitores pela pouca frequência dos posts mas a fase é de mudança. também mudança de blog. sempre para melhor claro.
Lisboa na ponta dos dedos abraçará também o Porto e como uma Plataforma Atlântica, que lançada perto do dia de Portugal defenderá a Portugalidade. o mês vai ser intenso e para comemorar a vinda do verão, que tem sempre 'tanta coisa que não precisa de nome' partilho a coragem de finalmente mergulhar nas profundezas do Atlântico. já tinha a ideia do curso de mergulho em agenda, assim o salto a 264 Km/hora. para ser em grande será nos Açores, no Pico do Refúgio. já sabem que depois da 'mais bonita solida do mundo' no Pico, é neste arquipélago que testemunho uma das moradas mais bonitas do mundo para se estar vivo, assim como quem acorda com o mais sagrado à flor da pele.
Saída de Emergência Vogue l A primeira impressão marca sempre
Tinha-a em agenda há várias semanas e parece que a minha intuição não me enganava. Na nova Boulangerie da Rua da Madalena, a entrada convida-me a descobrir rapidamente a porta da saída.
continue a ler a Saída de Emergência aqui.
03 maio 2012
28 abril 2012
a vida será sempre curta demais
descobri este filme no arquivo. nunca o tinha partilhado e deu-me vontade de saltar. desta vez em junho e com o que tiver vestido. fechado.
27 abril 2012
Saída de Emergência Vogue l a importância dos clássicos
Nunca me questiono sobre a importância dos clássicos. E no que toca ao Ritz Four Seasons não tenho dúvidas que é um dos mais constantes a acompanhar o pulsar da cidade. A respiração intemporal de um endereço que amadurece ao lado de Lisboa, enquanto vos escrevo estas palavras. Na companhia de muitas caras do mundo e de encontros de negócios, há ainda o piano que invade de sonho a atmosfera do bar carismático do Hotel.
Continue a ler a Saída de Emergência aqui.
23 abril 2012
a tradição ainda é o que era
quem não se lembra destes cadernos na história da cidade? o Caderno Azul da Firmo está de volta. renasce agora com um papel mais distinto, tem uma bolsa na contracapa para guardar cartões ou pequenos documentos, e surge com um elástico para fechar o caderno (que pode ser vermelho ou azul, consoante a preferência do comprador) e inclui também uma fita marcadora.
a etiqueta da capa, uma verdadeira imagem de marca, tem uma ligeira alteração das suas cores. o caderno está disponível nos formatos liso, pautado e quadriculado, nos tamanhos A5 e A6 e é apresentado com um packaging identificador (azul, vermelho ou dourado, consoante o tipo de folhas no seu interior). desde 8,50 €, no caso do A6, e 9,90 € para o A5.
22 abril 2012
aquilo que somos
na imortalidade do tempo, as portas das casas mais vivas da cidade, abrem-se a um futuro que não precisa de nome. horas que se abrem a memórias sagradas e que na beleza do tempo mais puro, constroem aquilo que somos.
questionam-me porque dois mil e dose é um ano bonito. na incerteza dos tempos, ou das caras que afinal não conhecíamos, há salvação nos postais - como o que habita nesta casa - que insistem em confirmar-nos toda a beleza. e se hoje sabemos que a casa mais importante é a interior, peço ao universo que nos leve, com suavidade, o receio dos momentos em que questionamos a destreza da vida.
hoje, enquanto abro a porta e me é tirada a respiração, pela confiança, pelas decisões difíceis ou por o que julgámos não ser possível nos outros, a importância de que somos sempre maiores numa casa. numa casa edificada.
20 abril 2012
Saída de Emergência Vogue l 'Porque Lisboa é bonita'
Luis Carballo está longe de imaginar que a minha discreta Leica vai roubando umas imagens que partilho nesta crónica. Passeando pela sala e falando com um sorriso largo com todas as mesas, o serviço está virado para o cliente, mas, mais do que isso, para a partilha humana. Todos os pratos chegaram em travessas porque na Taberna Moderna a missão é partilhar.
Continue a ler a Saída de Emergência aqui.
18 abril 2012
a consertação da dignidade humana
é 'difícil' deitar fora uma vida. e não uso a palavra 'desafio' que costumo sempre trocar sempre pela 'difícil' por que é sempre triste e deplorável dar a quem precisa os objetos que um dia foram de Alguém. sempre que tenho saudades de quem me construiu gosto de alcançar a memória para eternizar o aroma dos dias vividos. perguntava-me porque seriam precisos tantos meses para partilhar as camisolas de lã compradas no falecido alfaiate Piccadilly da Rua Garret, do homem das mãos de veludo. o giz que antecipa as costuras dos fatos não dura para sempre, assim como não dura para sempre o movimento das peças que se decompõem num armário que já não abre as portas.
depois de mais de doze meses sou chamada à casa que me viu crescer. é preciso coragem para libertar as peças de quem me gerou vida, na certeza de que o tempo é o bem mais precioso da nossa passagem pela terra.
tropecei muitas vezes para ver este filme e quase a sair de cartaz, a procura da concertação de tanta coisa que nos acontece e não conseguimos encontrar explicação. o que fomos um dia, o que mundo esqueceu e a inércia da memória que insiste em esquecer quem um dia dava manivela às rodas do tempo da cidade. as estações, a importância das estações e das paragens que nos entregam respostas.
são vidas que merecem ser recordadas, cerca de oitenta e cinco mil idosos que estão esquecidos na cidade. essas vidas que guardam histórias saberes, urgentes a redescobrir e a partilhar com os que hoje dão roda à manivelas dos relógios de Lisboa. já sabem que não me imagino reformada e que me vejo a trabalhar até o Universo me levar, mas não estarei eu também a ser chamada num tempo tão importante para a salvação da humanidade, ao resgate urgente da dignidade humana?
neste filme, onde levei o coração da minha Mãe a desanuviar a entrega dos objetos de uma vida do homem a quem dedicou a vida, remato o dia com a perfeição das horas. um dia onde me é prometida uma chave, assim como quem pede uma solução ao Universo.
e se o bairro nos fala de amor, é no encontro da beleza de três descobridoras de histórias, três descobridoras de olhos grandes, que ouso o puxar o fio, a partilha da passagem do tempo, horas que prometem um voo a todos os corações disponíveis da cidade.
17 abril 2012
Lisboa, a cidade cénica
o novo anúncio Toyota é assinado pela agência Saatchi & Saatchi França e foi filmado a preto e branco em Lisboa sob a direção da Salto Brothers.
que linda fica Lisboa a preto e branco, não acham?
12 abril 2012
Saída de Emergência Vogue l Tabernas há muitas
A personagem principal da experiência na nova taberna do bairro que me viu crescer – o Chiado – chama-se Bárbara. Poderia aplicar um ‘estudo psicológico’, ‘as suas causas remotas’ e as suas ‘consequências’ mas nesta morada retenho-me apenas nas flores, não na tragédia do final da história.
Continue a ler a Saída de Emergência aqui.
'em busca do tempo perdido'
Os idosos entraram na minha vida com mais força pela assistência da doença de Parkinson do meu Pai que me deu treze anos de curso de humildade. Observei o quadro mais bonito de entrega humana durante esse tempo da dedicação da minha Mãe em todos os minutos da sua vida. Com todos os defeitos que todos temos, há alturas da nossa vida em que percebemos do que afinal somos feitos e até onde vai o nosso limite. No caso da minha Mãe essa barreira é intransponível em relação aos outros. Contado não chegaria à altura de tamanha nobreza de coração que assisti entre quem me gerou vida e quem sabe um dia o Universo me dê poder suficiente para dar mais forma aos feitos estóicos que existem no mundo. No meu mundo.
Depois de treze anos de entrega e da fusão do meu Pai com o Universo há um ano e de me questionar o que será da velhice de todos nós como reformados em Portugal, sei que a vida é e será sempre mais presente do que futura e em vez de me focar no amanhã e se terei alguém que tome conta de mim, como teve o meu Pai ou terá a minha Mãe, tenho a certeza que a minha Lisboa na ponta dos dedos pode fazer alguma coisa.
Costumo rir-me sempre que pago a Segurança Social e o que será de nós portugueses e resta-me a alegria de que partirei deste mundo a trabalhar. Não me imagino reformada. Percebem-me não percebem? E mesmo que não contribua para a sociedade com a mesma energia que tenho hoje enquanto vos escrevo estas linhas, sempre me diverti com o cenário lírico de que ao oitenta anos ainda andaria pelas ruas da cidade com botas de cano alto de verniz preto, cabelo ao estilo Audrey Hepburn a tertúliar algures numa cave de Lisboa cheia de recortes e amigos a partilharem cálice de Real Companhia Velha.
Quando vejo reportagens como a que vos partilho em baixo, sela-se o manifesto que também quero fazer mais do que conversar com os idosos da minha rua ou oferecer boleia quando sei que precisam de ajuda. Ainda estou a cozinhar a ideia a mas coisa prometo estar à altura da tão bonita idea da Madalena Vitorino.
11 abril 2012
centros comercias, não obrigada
Mais de trinta anos separam estas duas imagens. Na mesma rua, a do Alecrim, onde estendia as tarde passadas em brincadeiras pelas ruas do Chiado. Por isso olho com ternura para uma das minhas sobrinhas à porta do legado do Alfarrabista do meu Pai, as quais nunca levo a centro comerciais, faça chuva ou faça sol.
Quando li hoje esta notícia agradeci aos céus. Com o nosso clima os centros comerciais são uma afronta, não apenas ao dinheiro que Portugal não tem, mas como apelo compulsivo ao consumo. Felizmente a humanidade está a mudar e estamos todos, uns por opção, outros à força, a consumir apenas o mais essencial.
Lembro-me também dos meus três anos em Amesterdão onde era normal pedalar à chuva e que ao mínimo raio de sol via os meus vizinhos montar um mini kit esplanada no meio da rua. Descalços bebiam vinho, como quem recebesse uma dádiva dos deuses. Os centros comerciais sempre me incomodaram por isso nunca divulgo nenhuma loja que lhes pertença.
Eu farto-me de dizer que a penosa crise (também para mim) também tem coisas boas e esta é com certeza uma delas, não concordam?
'Lisboa não é uma cidade qualquer'
Na sequência do post anterior e nas palavras com cinco anos mas tão atuais de Paulo Varela Cid, 'a esmagadora maioria dos países do mundo não têm nenhuma cidade como Lisboa, que seja património mundial'. Como é que entendemos a cidade?
Embora dramática (eu também o sou quando defendo tudo o que acredito), gostei da humildade da 'não inocência' quer do regime quer de todos nós. Já sabem que sou uma mulher de causas e quando vejo notícias como esta dos candeeiros do Terreiro do Paço sinto-me 'aturdida' e claro que seria impossível esquecer o grande Duarte Pacheco. Não é tão óbvio que é um erro crasso não salvar os últimos exemplares de um modelo de candeeiros do século XIX?
Embora dramática (eu também o sou quando defendo tudo o que acredito), gostei da humildade da 'não inocência' quer do regime quer de todos nós. Já sabem que sou uma mulher de causas e quando vejo notícias como esta dos candeeiros do Terreiro do Paço sinto-me 'aturdida' e claro que seria impossível esquecer o grande Duarte Pacheco. Não é tão óbvio que é um erro crasso não salvar os últimos exemplares de um modelo de candeeiros do século XIX?
obrigada IGESPAR
lembram-se deste post em que queriam fazer um silo com três andares em vez do silo subterrâneo, para poupar uns trocos, na Ribeira das Naus? pois parece que afinal não estamos entregues aos bichos. mais uma vez peço desculpa por qualquer expressão vernácula, mas depois de ter que lidar todos os dias na minha cidade com o bloco obtuso da Agência de Segurança Marítima e do Observatório Europeu de Droga e Toxicodependência, que nos vira as costas ao Tejo, a tolerância é mesmo zero.
excelente notícia aqui e aqui. e enquanto escrevo excelente lamento perder energia com decisões que para o meu bom senso e amor ao meu país me parecem tão óbvias.
excelente notícia aqui e aqui. e enquanto escrevo excelente lamento perder energia com decisões que para o meu bom senso e amor ao meu país me parecem tão óbvias.
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